A recuperação do Palácio do Congresso Nacional após a invasão de 8 de janeiro de 2023
Resumo
Este artigo registra as ações de documentação e recuperação física executadas pelo Senado Federal, por meio de sua Secretaria de Infraestrutura, na recuperação do Palácio do Congresso Nacional após a invasão e depredação sofridas em 8 de janeiro de 2023. Discutem-se os métodos de registro de danos, os procedimentos técnicos para sua recomposição e os resultados alcançados, a partir de perspectivas do patrimônio cultural, considerando a singularidade do contexto, a diversidade de valores envolvidos e a própria materialidade do edifício. A rapidez do processo foi viabilizada pela existência prévia de meios materiais e intelectuais: levantamentos físicos detalhados; especificações técnicas de serviços e materiais; contratos de manutenção robustos; e uma equipe própria de profissionais de arquitetura e engenharia, familiarizada com o edifício e sua manutenção. Apesar da extensão dos danos, concluímos que não se pode considerar a ideia de arruinamento, por não ter havido descontinuidade crítica na imagem, no uso e na própria matéria do edifício. Excluído o arruinamento, discutimos as possibilidades de a obra realizada se caracterizar ou não como restauração, em diferentes conceituações do termo. A partir do ponto de vista da conservação material, o caso faz refletir sobre como os resultados de intervenções como esta dependem não apenas da sensibilidade e da engenhosidade dos responsáveis, mas também das limitações e possibilidades abertas pelos próprios materiais a serem restaurados. A partir de um ponto de vista valorativo mais amplo, o caso explicita as contradições e conflitos de valores próprias da preservação: o Palácio foi invadido e vandalizado não por falta de reconhecimento, mas justamente por ser reconhecido como símbolo das instituições brasileiras; e esse mesmo valor simbólico impulsionou uma rápida recuperação, mais do que os valores artístico e histórico costumeiramente invocados.
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